Anna Politkovskaïa, últimas palavras
Não sei se chegou à imprensa portuguesa um texto de Anna Politkovskaïa, a jornalista russa assassinada a 7 de Outubro, que foi encontrado postumamente no seu computador, mas deixo aqui alguns excertos reveladores do seu combate contra o sistema preverso instalado na Federação Russa. Li o texto no jornal Le Soir, os excertos serão por isso tradução de uma tradução, sendo a última minha.
"Existe uma velha palavra em russo, kovërny, derivada da palavra kovër (tapete). Ela significa aproximadamente palhaço, mas é mais precisa. O kovërny entrava nas pistas dos circos e fazia trinta por uma linha afim de entreter o público. Tinha como missão evitar de o entristecer a qualquer custo. (...)
A quase totalidade da geração actual de jornalistas e da comunicação social existente é justamente composta de kovërny's. (...) Recordo que nestes últimos 5 anos o presidente Poutine não parou de construir uma vertical do poder que consiste de ponta a ponta para ele pessoalmente ou para aqueles que escolheu, nomear todos os funcionários e toda a hierarquia burocrática. A vertical do poder é um estado da organização política, onde todos os que são capazes de pensar de outra forma que os sues superiores, são afastados do meio dos responsáveis.
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No nosso país, na óptica da administração presidencial, que é na verdade o principal elo de comando da nação, esse estado é caracterizado pelo pronome os nossos. Os nossos são aqueles que estão do nosso lado. Como não estão connosco os não-nossos, os outros, são inimigos. A maior parte da comunicação social descreve de facto este dualismo e demonstram o quanto os nossos são bons e os inimigos execráveis. Apresentam geralmente como inimigos responsáveis políticos de tendência liberal, defensores dos direitos humanos e os maus democratas, todos vendidos ao Ocidente (símbolo do bom democrata é a fugura de Poutine). (...)Os jornalistas e a comunicação social começaram a amar apaixonadamente a sua própria comédia de kovërny: a luta pelo direito de emitir informações imparciais e de servir essas informações e não as da administração presidencial tornou-se um combate clandestino. Assim iniciou-se uma época de estagnação intelectual e moral no meio profissional ao qual eu igualmente pertenço. (...)Que acontece àqueles recusam participar nesta comédia? Tornam-se párias. Um vazio cria-se à volta deles. Os funcionários desviam-se então de ti quando te encontram em público mesmo se gostam muito de te falar clandestinamente. (...)Vomito na ideologia dominante com os seus nossos e os seus não-nossos. se um jornalista é dos nossos tem direito às recompensas, às honras, pode ser convidado a ir à Douma. (...)Se um jornalista não dos nossos, se é dos não-nossos está destinado a ser um pária. Não procurei ser um pária desta forma, a ser um golfinho rejeitado pelo rio. Na verdade não sou uma militante política. Que fiz eu, eu que sou covarde? Limitei-me a escrever sobre aquilo de que era testemunha. Nada mais. (...)O essencial, é ter a sorte de fazer o que me parece essencial. Descrever a vida, acolher todos os dias na redacção visitantes que não sabem onde ir perdidos na sua miséria. De um lado para o outro mandados pelas autoridades porque os que lhes está a acontecer não se enquadra nas concepções ideológicas do Kremlin, a história das suas misérias não pode aparecer em lado algum e apenas pode ser publicada regularmente no nosso jornal que se chama Novaïa Gazeta."
lipemarujo
"Existe uma velha palavra em russo, kovërny, derivada da palavra kovër (tapete). Ela significa aproximadamente palhaço, mas é mais precisa. O kovërny entrava nas pistas dos circos e fazia trinta por uma linha afim de entreter o público. Tinha como missão evitar de o entristecer a qualquer custo. (...)
A quase totalidade da geração actual de jornalistas e da comunicação social existente é justamente composta de kovërny's. (...) Recordo que nestes últimos 5 anos o presidente Poutine não parou de construir uma vertical do poder que consiste de ponta a ponta para ele pessoalmente ou para aqueles que escolheu, nomear todos os funcionários e toda a hierarquia burocrática. A vertical do poder é um estado da organização política, onde todos os que são capazes de pensar de outra forma que os sues superiores, são afastados do meio dos responsáveis.
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No nosso país, na óptica da administração presidencial, que é na verdade o principal elo de comando da nação, esse estado é caracterizado pelo pronome os nossos. Os nossos são aqueles que estão do nosso lado. Como não estão connosco os não-nossos, os outros, são inimigos. A maior parte da comunicação social descreve de facto este dualismo e demonstram o quanto os nossos são bons e os inimigos execráveis. Apresentam geralmente como inimigos responsáveis políticos de tendência liberal, defensores dos direitos humanos e os maus democratas, todos vendidos ao Ocidente (símbolo do bom democrata é a fugura de Poutine). (...)Os jornalistas e a comunicação social começaram a amar apaixonadamente a sua própria comédia de kovërny: a luta pelo direito de emitir informações imparciais e de servir essas informações e não as da administração presidencial tornou-se um combate clandestino. Assim iniciou-se uma época de estagnação intelectual e moral no meio profissional ao qual eu igualmente pertenço. (...)Que acontece àqueles recusam participar nesta comédia? Tornam-se párias. Um vazio cria-se à volta deles. Os funcionários desviam-se então de ti quando te encontram em público mesmo se gostam muito de te falar clandestinamente. (...)Vomito na ideologia dominante com os seus nossos e os seus não-nossos. se um jornalista é dos nossos tem direito às recompensas, às honras, pode ser convidado a ir à Douma. (...)Se um jornalista não dos nossos, se é dos não-nossos está destinado a ser um pária. Não procurei ser um pária desta forma, a ser um golfinho rejeitado pelo rio. Na verdade não sou uma militante política. Que fiz eu, eu que sou covarde? Limitei-me a escrever sobre aquilo de que era testemunha. Nada mais. (...)O essencial, é ter a sorte de fazer o que me parece essencial. Descrever a vida, acolher todos os dias na redacção visitantes que não sabem onde ir perdidos na sua miséria. De um lado para o outro mandados pelas autoridades porque os que lhes está a acontecer não se enquadra nas concepções ideológicas do Kremlin, a história das suas misérias não pode aparecer em lado algum e apenas pode ser publicada regularmente no nosso jornal que se chama Novaïa Gazeta."
escrito por Filipe a 10:19 da manhã
1 Pós e Contas:
Obrigado
5/11/06 19:18
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