[no feminino]
John Stuart Mill in «Utilitarianism, Liberty, Representative Government»
[aL]
A minha relação com os livros é idêntica à minha relação com os sapatos. Compro compulsivamente sem pensar se terei disponibilidade para os ler ou não. Aliás os meus amigos deixaram de marcar encontros comigo na FNAC, que "não valia a pena andarem atrás de mim enquanto eu investigo estante por estante, à procura aquele livro que tinha visto há uns tempos atrás", dizem eles. O cartão de crédito está a atingir os limites, e segundo a opinião de um outro amigo meu, devo ganhar muito bem porque o meu limite é maior que o dele.
Numa viagem longa não consigo decidir que livro levar. Desta vez não foi excepção.
Estava eu muito tranquila no bar do intercidades [sim estas coisas ainda existem] com o meu laptop aberto, rodeada de jornais e livros, ao meu lado alguém que eu supus ser o JoaoMiranda [é assim que eu imagino o JoaoMiranda], pergunta-me se estou a trabalhar na tese [a pronúncia estrangeira faz cair por terra a minha esperança de finalmente conhecer o JoaoMiranda]. Respondo [naturalmente] que não [mas o facto de ter na mesa o «MLA Handbook for Writers of Research Papers» pode ter sido o causador da confussão], que gostava era de estar informada e de conhecer outras ideias e teorias [a conversa parou por ali porque a minha mãe sempre me instruiu a não falar com estranhos].
Não deixei de ficar perplexa que um estrangeiro [que aparentava ser um académico que escrevinhava nuns papeis repletos de fórmulas matemáticas ou químicas, não sei bem], tivesse o reflexo imediato de pensar que alguém que leia livros [de não ficção] só poderia ser estudante [aqui entendido como aluno integrado numa instituíção de ensino], este é um um pensamento que eu reconheço na maioria dos portugueses, mas não esperaria num estrangeiro [talvez esteja em Portugal há demasiado tempo, o seu português era bastante claro...]
Para mim [que sou uma desiludida com o sistema de ensino totalmente reverencial e acrítico que se pratica nas Universidades Portuguesas, com aversão ao debate de ideias, à divergência] a instrução do indivíduo, para além do percurso formal, deve passar por um circuito informal de conhecimento. Para isso é fundamental ler e estudar, entrar em contacto com teorias diferentes das nossas, assistir a debates, procurar informação, pensar e discutir sobre os assuntos que mais nos interessam. Só assim poderemos ter uma sociedade mais evoluída, mais capaz. Mas isso depende da vontade de cada um.
Terminei este fim-de-semana de ler um livro que há um par de meses me tem acompanhado: Liberalism and Democracy [originalmente publicado em 1988, a minha edição é uma tradução inglesa de 2005, pertencente à muito interessante colecção Radical Thinkers] de Noberto Bobbio.
Neste pequeno livro, Bobbio traça com simplicidade e muita elegância os caminhos da Democracia e do Liberalismo [a ideia de que se trata de uma comparação é ilusória e só poderá acontecer por citações excessivamente truncadas]. Estes caminhos nem sempre paralelos, ora se cruzam, ora seguem em direcções opostas, são caminhos que nos trouxeram ao mundo contemporâneo democrático, onde a liberdade é um valor fundamental. Os caminhos só existem ao serem percorridos.
Achei pois, muito curioso os 12 tópicos do Rui e a proximidade temática com um dos meus livros de cabeceira. Não consigo no entanto compartilhar com um certo tom pessimista dos tópicos... Considero que a capacidade adaptativa dos indivíduos delinhará convenientemente as fronteiras da democracia e os limites da liberdade [quanto mais informação e conhecimento o individuo tiver, mais livremente fará as suas opções]liberalism and democracy, of necessity become allies.*
There is one form only of equality – equality in the right to liberty – which is not only compatible with liberalism but actually demanded by its view of freedom. Equality in liberty means that each person should enjoy as much liberty as is compatible of others […] this form of equality inspired, very early in the development of the liberal state, two fundamental principles that came to be expressed in constitutional provisions: a) equality before the law and, b) equality of rights. *
Liberal ideals and democratic procedures have gradually become interwoven. While it is true that rights to liberty have from the beginning been a necessary condition for the proper application of the rules of the democratic game, it is equally true that the development of democracy has over time become the principal tool for the defence of rights to liberty.*
*Noberto Bobbio, in «Liberalism and Democracy»
[aL]
To consider this dialectical interplay between liberalism and democracy in the perspective of general political theory is to realize that underlying the conflict between the liberals, with their demand that the state should govern as little as possible, and the democrats, with their demand that the government of the state should rest as far as possible in the hands of the citizens (a conflict which is being continually transferred to higher levels without attaining any definitive resolution), is a clash between two different understandings of liberty. [...] this wholesome dispute is not of a kind to be resolve once and for all, and insofar as it has from time to time issued in agreement, this has been in the nature of a compromise. Unfortunately, not all regimes have the benefit of the conflict, which is denied outlet where the first kind of liberty is usurped by unlimited power, or where the place of the second kind is usurped by a power without public accountability. Faced with either of these alternatives, these hostile twins, liberalism and democracy, of necessity become allies.
Noberto Bobbio, in «Liberalism and Democracy»
[aL]
Maltidas férias!
(Prometeu)